Intitula-se este editorial "Estado e crise dos partidos". Diz a certa altura: "Por isso, sempre que se fala da crise dos partidos, do desinteresse da política, da falta de empenho cívico, fala-se, ainda que inconscientemente, do peso do Estado." A seguir relaciona o peso do Estado com o desinteresse dos jovens com competências pelos partidos (infere-se do texto que o editorialista se refere sobretudo ao PS e ao PSD), porque "ali não se trata de sonhos, de ideias, de vida, mas de empregos, de sinecuras, de 'tachos'. O editorialista atribui a crise dos partidos a este desinteresse dos jovens. E acaba a dizer que romper com o círculo formado pelo desinteresse dos jovens com competências pelos partidos - crise dos partidos - máquina do Estado alimentada pela máquina dos partidos - sensação de as ideias não valerem nada, nem o mérito ou o esforço - desinteresse dos jovens com competências, "Romper com esse círculo é fazer a reforma do Estado. Diminuir o seu peso, torná-lo transparente, dotá-lo de uma espinha dorsal profissional (e não de membros do aparelho político que está no poder).
Este raciocínio tem várias falhas. A primeira (e talvez a principal) é que omite que o actual estado de coisas se deve sobretudo à desideologização dos partidos, que quando estão no poder ou lá perto, são máquinas de ganhar eleições, e encaram o Estado como o meio para recompensar as suas clientelas, distribuindo lugares e benesses a quem os apoiou. Assim não há lugar para desenvolver políticas adequadas aos interesses do povo, até porque muitas vezes vão bulir directamente com interesses estabelecidos.
Outra falha é esquecer que os jovens estão a ser formados nas escolas não para desenvolverem políticas de interesse, mas sim para conseguirem bons lugares quando chegaram ao chamado mercado de trabalho. E isto na melhor das hipóteses. Os jovens aprendem na própria escola (ou fora dela) que para conseguirem o emprego de que precisam para sobreviver têm de estar ligados a boas influências, que é claro abundam mais nos partidos do poder ou em outras esferas tradicionais. Para conseguirem o tal emprego convem que sejam bem falantes, mas com ideias pouco heterodoxas.
É interessante contudo a referência à necessidade de o Estado ter uma espinha dorsal profissional. As medidas chamadas de reforma tomadas nos últimos anos apontam no sentido do enfranquecimento das estruturas profissionais existentes no Estado (na realidade resumem-se a reduzir regalias dos funcionários, e preparar o encerramento de serviços e despedimentos em grande escala). Passar por cima disto é, consciente ou inconscientemente, tentar iludir as pessoas. A não ser que o editorialista se queira apresentar como não pertencendo à área do poder, o que é estranho, não só tendo em conta a conhecida conotação do Expresso com o PSD (partido desde a sua fundação muito ligado ao Estado português), como também por uma tecla em que ele, editorialista, toca, e que tem sido insistentemente batida pelos partidos de direita e pelo PS (que muito boa gente também coloca na direita), ao fim e ao cabo, os partidos do poder. É a questão do peso do Estado, que acha ser necessário diminuir. Sem querer entrar agora na discussão profunda do assunto, cumpre dizer que querer diminuir o peso do estado, sem referir os objectivos que se pretende atingir (que não exclusivamente financeiros) com essa redução, os critérios utilizados para cortar nos serviços e as salvaguardas a criar para as populações afectadas, é o que tem sido feito ultimamente pelos governos PS e PSD-CDS. Faz-se o reparo que nada tem sido feito em prol da tal espinha dorsal profissional, a não ser dizer, aberta ou veladamente, aos profissionais dos serviços públicos, que fariam melhor em procurar emprego noutro lado.
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